Desde 2015, o Setembro Amarelo é destacado, nacionalmente, como um mês de prevenção ao suicídio por entidades como o Centro de Valorização da Vida (CVV), o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Associação Brasileira de Psiquiatria, entre outras. Apesar de a mobilização ocorrer durante o mês inteiro, apenas o dia 10 é conhecido, mundialmente, como uma data de diálogo sobre o ato e os fatores que o antecedem.
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Nos últimos anos, o Rio Grande do Sul se tornou o Estado com a maior incidência de casos de suicídio no país. Conforme os dados de 2020, que são os mais recentes fechados até o momento, a média de ocorrência foi de aproximadamente quatro mortes do gênero por dia.
Em 2020, Santa Maria registrou 33 óbitos em que a causa foi constatada como suicídio. No ano seguinte, foram 30. De janeiro a agosto deste ano, 36 mortes foram registradas. Mais do que um alerta, os números refletem a necessidade de reconhecer a importância da saúde mental no dia a dia, de olhar para outro com maior atenção, buscar ajuda profissional e, principalmente, falar sobre o assunto sem medo ou receios.
Sem programação, o diálogo fica a cargo dos serviços de saúde
Apesar de necessário, Santa Maria não conta com uma programação alusiva ao Setembro Amarelo, organizada pela prefeitura, neste ano. Consequentemente, a conscientização e a prevenção ao suicídio devem ganhar força na prática, dentro dos serviços de saúde disponibilizados pela Rede de Atenção Psicossocial do município.
Foto: Nathália Schneider (Diário) ACOLHIMENTO Cerca de 500 atendimentos foram realizados no local, por mês, de 2013 a agosto deste ano. Espaço funciona de segunda a sexta
Acolhe Santa Maria
Desde 2013, Santa Maria conta com um serviço especializado com o intuito de atuar como referência para vítimas diretas e indiretas da tragédia da Boate Kiss, que resultou em 242 mortes e mais de 600 pessoas feridas em 27 de janeiro daquele ano.
Enquanto espaço de saúde mental, o Acolhe Santa Maria também atende usuários, via Sistema Único de Saúde (SUS), que apresentem crise emocional relacionada ao comportamento suicida (o pensamento, o plano e as tentativas), situações de natureza traumática e de luto. Conforme dados fornecidos pelo serviço, até o momento, foram registrados cerca de 500 atendimentos mensais referentes a suicídio, traumas e luto.
– Para serem atendidos, os usuários devem acessar as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e realizar consulta médica para avaliar a necessidade do atendimento. Se for confirmada, ele receberá um encaminhamento e poderá buscar o primeiro acolhimento no Acolhe – explica o psicanalista, doutor em psicologia social e coordenador do Acolhe Santa Maria, Volnei Dassoler.
Atendimento
Atualmente, o espaço segue duas frentes de trabalho com intervenções especializadas e apoio matricial às equipes da Atenção Básica do município. O paciente atendido permanece em acompanhamento até apresentar uma condição de melhora que indique que está fora da experiência aguda do sofrimento ou do risco de suicídio. Nos últimos anos, Dassoler relata que público atendido tem apresentado mudanças:
– O grupo de mulheres é mais expressivo, mas essa sempre foi uma realidade na saúde mental. O que chama a atenção é o aumento de sofrimento e a busca por parte de adolescentes e pela população masculina.
Para o psicanalista, nas experiências agudas de sofrimento, o que se sobressai é o esgotamento das condições e recursos que cada pessoa tem a dispor e que, eventualmente, lança mão cotidianamente para dar conta das dificuldades. Nesse contexto, a pessoa pode viver uma experiência de solidão aterrorizadora, que parece ser definitiva. Para proporcionar acolhimento ao paciente, a equipe do Acolhe Santa Maria oferece acompanhamento psicossocial e, em alguns casos, o recurso farmacológico.
– Como o serviço já tem um reconhecimento social, recebemos encaminhamentos de pessoas em diferentes estágios, alguns com pensamento, outros com risco iminente e alguns após terem realizado alguma tentativa. Observamos que, para essas pessoas, não existe tabu ou constrangimento para falar sobre o tema. Conversam abertamente, o que para nós sempre é interpretado como um convite para participarmos do seu drama pessoal e social e escutar a sua história de vida, os motivos que as fizeram considerar essa possibilidade – relata Dassoler.
Serviço Acolhe Santa Maria
Horário de atendimento – De segunda a sexta-feira, das 8h ao meio-dia e das 13h às 17h, com exceção das quartas-feiras à tardePúblico – O serviço atende a população em geral, sendo maior de 14 anosEquipe – Multiprofissional composta por psiquiatra, psicólogos, assistentes sociais, enfermeira, agente administrativo, residentes de Terapia Ocupacional, Serviço Social e Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)Endereço – Rua Treze de Maio, 35Telefone – (55) 3219-2333 ou (55) 99164-4154E-mail – [email protected]
Busque ajuda também
Centro de Valorização da Vida (CVV) – Ligue 188Em uma unidade de Saúde de referência
Arte: Paulo Chagas
É preciso falar e saber ouvir
Entre os diversos eventos promovidos neste mês, esteve o 1º Simpósio Pega Leve, realizado de 8 a 10 de setembro pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). As rodas de conversa, que foram transmitidas pelo canal da instituição no YouTube, trataram sobre promoção de saúde, prevenção ao suicídio e promoção da vida, contando com a presença da professora doutora do curso de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Daiana Foggiato de Siqueira.
Enquanto líder do Grupo de Pesquisa (GP) sobre Cuidado em saúde mental e formação em saúde na universidade, ela destaca a necessidade de desfazer impressões sobre a busca por ajuda profissional:
– Ainda temos um estigma muito forte sobre saúde mental. Então, pessoas que têm um sofrimento psíquico, muitas vezes, não procuram os serviços de saúde ou as pessoas próximas, por medo ou receio do que irão falar. Como sempre digo, as pessoas precisam procurar ajuda e quem está próximo, visualizar os sinais.
Para Daiana, que acompanha dentro e fora da UFSM o desenvolvimento da pauta, é essencial ouvir e falar sobre suicídio.
– É um mito que se a pessoa falar sobre ou você perguntar se a pessoa tenta ou já tentou tirar a própria vida, estará dando ideia para ela. É um mito. As pessoas precisam colocar se elas pensam ou não, porque precisamos ajudá-las – afirma a professora.
Pesquisas indicam uma crescente em casos de suicídio entre a população mais jovem. Os fatores, popularmente chamados de gatilhos, podem estar relacionados a expectativas, frustrações, medos, cansaço, problemas financeiros ou relacionamentos pessoais, excesso de trabalho ou estudo, distanciamento da família, uso de drogas, entre outros, que contribuem para a baixa na qualidade de vida.
– Quando falo em cuidar da saúde mental, é no sentido de indicar que faça as coisas que gosta e tenha prazer nisso. Que esteja ao lado das pessoas que gosta, que procurem ajuda. Dessa forma, quando essa pessoa não estiver bem, procurará um amigo, um colega, alguém próximo ou algum serviço de saúde – afirma Daiana, que cita alguns sinais a serem observados diariamente.
Fique atento a sinais como:
Rápida mudança de comportamentow Busca por isolamento e introspecçãoDificuldades em interagir socialmentew Dificuldade para dormir (insónia)Aumento ou diminuição do peso de forma repentina
Em adolescentes:
Mudança repentina de comportamentoUso de roupa de manga comprida em período de calor na busca por esconder autolesões
Cenário
Entre 2020 e agosto de 2022, Santa Maria registrou 99 suicídios. Neste ano, são 36 casos até agora, número superior a todo o ano de 2020 (33 suicídios) e de 2021 (30). No Estado, os números são mais alarmantes e contribuem para a constatação de que o Rio Grande do Sul tem o maior índice no país.
Conforme a Secretaria Estadual da Saúde (SES), entre 2018 e 2020, ano mais recente do estudo, 4.085 suicídios foram registrados. A SES reforça que os dados de 2021 ainda são considerados parciais, porque os serviços de vigilância em saúde têm até o final do ano subsequente para o lançamento das causas de óbito no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM).
A partir de janeiro de 2023, os dados sobre óbitos referentes a 2021 serão considerados fechados e, posteriormente, divulgados pela secretaria.
Número de óbitos por suícidio
Em Santa Maria
2020 – 332021 – 30De janeiro a agosto de 2022 – 36
Fonte: Prefeitura de Santa Maria
No Rio Grande do Sul
2020 – 1.4192019 – 1.4252018 – 1.241
Fonte: Secretaria Estadual de Saúde (SES)
Arianne Lima – [email protected]
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